domingo, 18 de março de 2012

Foragida

Desapareceste. Do meu mapa que anseia pelo teu retorno, da minha vista e do alcance do meu toque quente e húmido. Onde estás quando eu preciso mais? Que me afagues o cabelo e me sussurres ao ouvido. Onde estás quando o meu vazio precisa de ser preenchido pela tua presença, pela tua figura e pelo calor da luz dos teus olhos. Reflectem o Sol, como o céu.

Não te vejo porque te escondes. Escondes-te por entre os pingos de chuva e enfias a cabeça debaixo da areia ao sinal do meu incómodo. Eu tiro-te o conforto e apelo ao perigo, sou perigoso. Tu não tens medo, queres tanto quanto eu cair na minha rede e que eu te agarre para sempre. Sou arriscado, um risco que não sabes se podes correr porque nunca correste. Nunca correste ao lado de um unicórnio branco, depenado. Deste-te ao trabalho de o depenar para te certificares que ele não voava e no entanto... Tens medo de o montar, mesmo sabendo de todos os sítios onde ele te podia levar. Eu acho que tu sabes de tudo isto, tentas lutar contra a tua natureza que te prende à Terra Mãe e recusas-te a viajar no comboio para longe. Tens uma estaca que te prende e estás à espera que eu te solte. Diz-me onde está essa maldita, mostra-te. Se te escondes não consigo despedaçá-la e despedaço-nos aos dois. É isto que acontece quando duas criaturas feitas do mesmo se encontram contra todas as possibilidades. Aparece, quero-te libertar desse colete de forças que criaste em ti mesma, quero-me libertar de um sonho que sei que pode ser Liberdade. Agora é tarde para desistires, estás só a adiar o desfecho... porquê?

O cepticismo é fatal em questões do amor de algibeira e tu tem-lo de sobra. Livra-te dele e cairás quando tiveres de cair. Honrando uma promessa que fiz a mim mesmo e a quem lê o meu pensamento, "agora que estamos sós, vamos ser apenas nós". Nunca fez tanto sentido, mas ainda assim, tu recusas-te a oferecer-me a tua mão de bandeja. Nem eu a queria assim, quero-a fechada e trancada com chaves impossíveis de encontrar. Quero procurá-las enquanto te encontro. É irónico como o universo está cheio de estrelas, planetas e pessoas e no entanto foste tu quem eu escolhi, como se pudesse escolher. Não foi mais ninguém.

terça-feira, 13 de março de 2012

Caprichos

Quando menos parece é quando mais precisamos de uma pancada nas costas. Refugias-te na banalidade do dia-a-dia comum, nas coisas mundanas. É a única forma que tens de te misturar, de passares despercebido. Fazes coisas vulgares. Tornas-te vulgar. Pode ser bom, se não tiveres um lado sonhador adormecido. Aí terias de fazer muito pouco barulho para não o acordar, terias de te tornar silencioso e ter medo de ti próprio. Ter medo de não gostar daquilo que fosses quando te olhasses ao espelho, porque ias ver o mesmo, sempre o mesmo. Quem te manda ser assim? És tu próprio. Parte de ti dá valor ao confortável, e conforta-se no pensar que a estabilidade traz bons resultados. Até poderá trazer, mas traz dúvidas. Como é que vais saber se o teu futuro é mesmo este, como é que podes não te arrepender de não ter seguido outro caminho? Não arriscaste.

Eu quero arriscar, poder dizer que cruzei os meus erros com as minhas acções e que fiz aquilo que sentia necessário. Errar por minha própria culpa, se tiver de o fazer. O pior arrependimento é de não ter feito. "Não fiz, não senti, não te disse, não falei, não fui embora, não voltei para te buscar". Chamem-lhe caprichos, manias de quem sempre teve tudo e nunca teve nenhum verdadeiro desafio, para mim são caprichos. Caprichos de alguém com uma vontade enorme de mostrar a todos o que vale. Alguém que está farto de estar confortável, que quer arriscar e crescer.

Não prefiras o confortável nem tenhas medo de te perder nesta penumbra deliciosa. Fecha os olhos e abraça uma aventura que te pode levar onde nunca foste. O risco é um pequeno preço a pagar pelos três passos que dás ao mesmo tempo na vida que tens de aprender a viver. Caminha, corre, não estás sozinha. Se tiveres de cair, eu caio contigo. Dá-me a mão e NÃO TENHAS MEDO DE ARRISCAR, ninguém precisa de segurança.

sábado, 10 de março de 2012

Vamos dar uma volta

Sentados e embalados, seguimos o curso do rio que nos envenena. Envenena-nos por estar tão próximo, ser tão gracioso e ao mesmo tempo... não lhe podermos tocar. Toda a água desaparecia, era absorvida por nós e seríamos cúmplices de um crime sem culpados. Quando me tento levantar e penso que há riscos a correr, estico o meu braço e tento ancançá-lo. Magneticamente, o leito desvia-se de mim, dizendo-me para ter calma porque o percurso faz valer a pena.

Não aguento assim, sem saber qual é o destino, ainda falta muito? Não respondes, como é normal. Fechas-te nas tuas copas e sorris. Eu observo e estou magicamente obrigado a fazer-te a vontade, recolho a mão. Parte de mim acha que me acabaste de salvar de uma desgraça, mas a outra (corrosiva) diz-me que és tu a desgraça e que os extremos se podem e devem tocar.

Silenciosamente perguntei-te o que farias sem mim, na minha cabeça. Tentei imaginar-te a responder, sempre sem cruzar os olhares, talvez me dissesses para ir e ser feliz. Talvez soltasses uma lágrima que deixava um rasto de sal e um gosto agridoce, tal como tu. Para onde gostavas que eu fosse? Gostavas de ir comigo? Talvez fôssemos escalar montanhas ou talvez ficássemos num trono de madeira e tijolo. Aquele que tu adoptaste como se fosse teu. Rodeados de mantas que fazemos voar pelos ares, não precisávamos de sair daqui. Uma viagem está ao alcance de uma nuvem de fumo e de combustível a arder dentro de nós.

Uma viagem à terra de ninguém, uma terra que passa a ser nossa, mas apenas se quiseres vir. Estendo-te a mão, é este o barco em que queres seguir?

sexta-feira, 9 de março de 2012

Universo

Um misto de desilusões assola-me as ventas. Desilusões próprias e privadas. Um rasgão público daquilo que sou. Quando o nosso melhor não chega, quando nos tentamos convencer disso. Daquilo que nunca fui. Tentamos gastar o tempo que nos foi concedido a fazer algo que nos deixe meio alegres, que nos ocupe e nos entretenha. Temos objectivos definidos e gostamos de acreditar que a felicidade existe e depende deles. Temos de acreditar. Que seria de nós? Concentramo-nos tanto que nos esqueçemos que a cada esquina vive um canteiro pronto a desabrochar uma planta. Que a a cada pedra da calçada que pisamos com determinação se esconde uma formiga tímida. Esquecemo-nos do mundo e de nós. Mea culpa. Esqueço-me tantas vezes de que não sou infalível e de que a sorte nem sempre vai proteger os audazes. Que nem sempre sou audaz. Esqueço-me de olhar mais para mim e menos para aquilo que quero. Esqueço-me de equilibrar o exagero do romance com a eloquência de um sorriso bem esboçado. Esqueço-me de amar.

É o Universo que faz questão de tornar público estes esquecimentos enquanto me atira tudo de uma vez, para me manter os pés na terra. Tenho tão pouco que me esqueço de que não preciso de tanto. A Lei da gravidade diz-me para voltar às origens, enquanto o universo me empurra. Esqueço-me que não posso querer tudo de uma vez. Esqueço-me e desiludo-me. Saio da pequena bolha com que tentava cruzar a atmosfera. Quando ela rebenta eu aperto a mão ao Universo e apercebo-me que os homens não podem voar. Desiludo-me novamente quando aterro no sopé da colina, depois de ter alcançado o topo. Voltar ao topo levará o seu tempo, novamente.

Desiludo-me porque a solidão da minha sombra é fria e escura. Continua escura e só. Desiludo-me porque afinal, no fim de tudo, fui eu que assim escolhi sem me aperceber. Ainda estou a tempo de mudar? O Universo diz que sim, mas eu digo que não. Vais ter de me convencer do contrário, o jogo é a pares.